terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Mão de faca


Não sei da história, mas tenho certeza de que o parto foi sofrido. Não pode ter outra explicação essa fome de vida. Imagino também a primeira vez que viu o mundo: olhos bem pretos e arregalados. Nascia negro, mão de faca, insolente e carinhoso. Cresceu no meio do mato e no coração da cidade. Foi moleque no terreiro e no asfalto. Canela fina, sempre tinha resposta pra tudo, nem que inventasse, nem que enrolasse, nem que gargalhasse. Desde cedo, soube o que é ter destino e aprendeu no tocar do tambor o que nunca precisou ser ensinado. Filho de Oxosse, pôs flecha na mão e no pé, virou capoeira. "Nesse mundo camará, mas não há, mas não há, mas não há quem me mande". O mundo é o meu quintal, e quem manda na minha mata sou eu - imagino ele dizendo isso. Folgado, metido, abusado e tão querido por onde passa, esse nego malandro sabe convencer, no grito ou no papo, pra no fim tudo ser um pouco do seu jeito. Falando assim, parece até que ele é diplomático. Porra nenhuma, briga brincando, brinca brigando e não queira ver ele de outra maneira. E outra, não mexa no seu chapéu. Homem que é homem sabe que não se mexe na cabeça dos outros que os lá de cima logo gritam: Perá lá, que aí mando eu!

Como faz pra conhecer ele? Primeiro te digo cuidado, maneira nas piadas e relaxa nas risadas. E pra encontrar com ele é só sair andando pelas ruas, passar nas curimba, nos samba e nos pagodes. Segue o toque de tambor. Ele é filho do vento, tá onde o vento for.

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