sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Madrugada... é a minha companheira


Já era anunciado: vocês vão ser amigos. E como fugir dessa premonição tão bem feita? Eu confesso que só o nome já me motivava. Adoro a noite. Sempre fui daqueles que buscava na Madrugada a companhia para os meus pensamentos e sentimentos. E muito mais preciso do que qualquer previsão do tempo, de fato viramos amigos. Em tempo recorde e de um  jeito recorde. O que fazer? Gosto de superar metas. E olha que ser amigo de uma mulher dessas é ter uma meta alta. Mas eu não tenho outra opção. O amor de uma amizade é mais persistente do que um enxame de carrapatos em fevereiro. E assim, me fingindo de bobo cada vez que você faz um questionário apurado da minha vida só pra não falarmos da sua, fomos ficamos cada vez mais próximos. Não te questiono por isso. Também sou do tipo que leva a vida em silêncio pra poder conferir se o coração continua batendo. O importante é estarmos próximos, um com o outro. Porque hoje é difícil tirar essa sua companhia ausente da minha vida. É difícil e eu não quero. Por todos os risos, por todas as palhaçadas, por todas as idéias e as patadas. Por todos os problemas divididos, pela fé, pelas famílias e por que não?, pelo Billie Bundinha e pela muda de boldo que sua mãe me deu. Quero você junto de mim sempre, mesmo que longe, mesmo que calada e mesmo que você não queria. Sim, até assim eu quero. Porque eu sou ruim e nunca disse que não era. E esse é meu jeitão.
E você, minha irmã de santo, de coração e de amor saiba que somos iguais. Eu também me escondo no fundo de uma  mata fechada por que é assim que sei viver. Mas que você saiba que se precisar é só atirar uma flecha pro alto ou assobiar, que vamos juntos matar as feras e os bichos que aparecerem em nossos caminhos. 

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Amar sob os trópicos


Só se tem a verdadeira noção do quanto são efêmeras as cartas de amor quando nos vemos diante da imensidão branca de um papel. É tudo tão insuficiente, tão óbvio, tão redundante que o nosso senso crítico nos impede, na grande maioria das vezes, de seguir adiante. Mas se existe algo mais infantil, mas ingênuo e humano do que uma declaração de amor eu desconheço. Somos seres sob duas pernas com polegares opositores e que amam. E o que é o amor? Mais cretino ainda seria perguntar. Mas não é só a saudade uma palavra especial do português, o amor também é. E pra isso que eu estou escrevendo. Para explicar o inexplicável sentido do amor em português. Porque talvez o meu seja analfabeto, talvez estrangeiro, talvez seja inocente, talvez seja leviano e talvez seja até verdadeiro. Fazer o que se tenho essa dúvida? Uma dúvida lingüística e apaixonada de saber se você sabe o que está dizendo.

O amar sob os trópicos é sentir nas marolas do mar o cheiro do seu amor. É fingir que se esquece da vida, andar de noite na beira da praia e confundir o reflexo da lua na areia com o brilho doce dos pêlos loiros do seu corpo. É olhar para o céu e só conseguir ver as mínimas manchas amareladas de seus olhos azuis no brilho de uma enorme lua cheia. É perder-se nas memórias como quem entra de olhos vendados em um labirinto, e ignorar o perigo de nunca mais se encontrar. Amar aqui na minha terra é se distrair entre outras coxas pensando nas suas. E encontrar em tantos outros sabores a falta que o seu faz. É nem sequer chorar por essa falta, por essa distância. Porque é impossível chorar quando se tem na memória o brilho de um sorriso, por mais enorme que seja o vazio deixado no peito, na cama e na vida. É viver em uma felicidade descontrolada de criança com presente novo. É jogar-se. Viver-se no amor ao outro. E como em português não há amor sem saudade, é vivê-la como um trunfo. Como um prêmio por entregar um pedaço do seu coração pensando na inconseqüência de um amanhã. É que aqui abaixo da linha do Equador, nós somos inconseqüentes por natureza, por princípio e por finalidade de vida.

Se hoje paro para escrever esse texto não é só por uma questão de tradução de idiomas. É para explicar aquilo que não precisa ser dito. É para encontrar aquilo que não precisa ser procurado. Que está aí e simplesmente é. Amor. Amor de longe, amor de lua, amor de mar que nos separa. É como um pescador que mesmo sabendo do perigo do canto da sereia se joga no mar por não haver outro jeito e por não querer outro jeito.  É que aqui na minha terra é assim. É viver dentro do mar, amar, ao mar e enrolar-se nos cabelos longos e doces de uma felicidade de maré.

terça-feira, 16 de julho de 2013

Flor, negra flor


Cheguei tímido como a criança que ainda sou. Ela me ofereceu uma cama grande cheia de almofadas como quem oferece uma xícara de chá quente numa noite fria. Tive medo, confesso. É que mãe e pai sempre me falaram para não falar com estranhos. Mas negar não era uma opção. Há mulheres que são donas de si e de nós, e isso não é negociável. Fui e praticamente não dormi. A pele quente e negra encostava na minha perna e roubava qualquer tipo de tranqüilidade.  Sabe Deus como consegui resistir. O amor e o desejo quando são viscerais assustam, principalmente às crianças.

Mas era inútil, tudo em mim já pertencia a ela, pensamentos, sonhos, medos, desejos. No dia seguinte foi a mesma coisa. Sua cama era macia como areia movediça e eu me deixei ir como uma Naja à flauta de um encantador. Até mais fácil que isso. O barulho dos corpos nos lençóis rasgava as paredes de barro do quarto. Nossa respiração dizia tudo aquilo que nunca será dito. Sua pele era quente como um dia de verão. Éramos amantes recentes de uma vida inteira.


O sol raiou e todos acordaram. Em nosso olhar não havia nada de perguntas, nada de explicações, nada de medos. Éramos um do outro como sempre fomos e sempre seremos. Há mulheres que são donas de si e de nós, e isso nunca é negociável.

sexta-feira, 28 de junho de 2013

Uma mulher


Acordou tarde como sempre. O prazer gosta mais da noite do que do dia. O sol  já rasgava o quarto. Mais um dia, mais um dia...Chinelo, xixi, rosto e água na chaleira. Apito, pó, caneca e o café batendo no estômago.  Na televisão não se falava em outra coisa: o povo acordou.  Ela achava bonito ver toda essa gente reunida, mas ainda lhe faltava coragem. Tinha até vergonha de dizer isso para as outras meninas que participavam de todos os protestos, disfarçadas é claro. Mas a noite de ontem tinha sido muito boa, e ela acordou se sentindo mais mulher. Decidiu ir. 
A hora passou voando cheia de expectativas. O povo ia encher a Presidente Vargas. Tudo combinado com as meninas. Depois da passeata elas iriam passar na casa da Nicole e de lá direto para a boite. Roupa discreta, pouca maquiagem, um brinco delicado e desceu as escadas deixando aquele cheiro doce de creme hidratante no ar. 
Elas se encontraram em frente à Candelária,  chamando a atenção dos homens.  Seguiram andando em direção à prefeitura e viram muita coisa bonita. Família, namorados e até gente de idade. A Vanessa levou um cartaz: mais amor, por favor. Viu alguns caras conhecidos que viraram o rosto disfarçando. Mas não se importou. Ela estava feliz, chegou a chorar de alegria.
A noite foi chegando disfarçada entre gritos de protesto e  holofotes de helicópteros sem que elas percebessem. Estavam em êxtase. De repente, as pessoas começaram a ficar mais agitadas. Uns moleques quebraram um ponto de ônibus e ela quase partiu pra cima deles. Tudo virou confusão e correria. Fugiram pela Regente Feijó, mas foram encurraladas junto com uns garotos por uma tropa de 12 policiais. Era tanta fumaça de gás que mal dava pra abrir os olhos. Aquilo rasgava a garganta e abafava qualquer grito. Levaram muito tapa na cara, e até protegeram o tal grupo de meninos. Todas ali já estavam muito acostumadas a lidar com homem valente. Depois foram embora. Humilhadas e de alma ferida.
Essa noite não conseguiu trabalhar. Foi pra casa e quis nunca mais sair de lá.  Mas não tinha jeito. Amanhã voltaria a vida normal. A fumaça seria a dos cigarros e outros gritos ficariam abafados. Tinha que trabalhar e aproveitar para fazer um dinheiro maior. Fazer o que? Em época de crise os puteiros sempre ficavam mais cheios. 

quinta-feira, 13 de junho de 2013

Promessa



De um tirou o menino e escondeu debaixo do travesseiro. O outro colocou de cabeça para baixo. E aquele pequenininho de porcelana que fica do lado da cama, colocou dentro de um copo d’água até a graça alcançar. Era dia de Santo Antonio e tinha muita mandinga pra ser feita.

Acendeu vela na igreja e rezou no pé do santo. De uma ladeira bem alta rolou um coco pra esquecer do antigo amor. Pôs nome no mel, calcinha vermelha e vela amarrada de fita. Penou pra encontrar uma bananeira que pudesse com uma faca cravada no tronco dar com a seiva a inicial do próximo amor. Champagne na beira do mar, perfume pra Iemanjá. Me ajuda ó doce yaba! Fez tudo, tudo o que sabia e o que não sabia. Acendeu vela vermelha e cigarro na meia noite que tudo transforma. Chegou em casa cansada de tanto esforço, de tanta vontade. Caiu na cama leve e encontrou no meio dos lençóis o que procurou durante o dia todo. Ela mesma.

(postado tb em facebook.com/MulheresCronicas)

quarta-feira, 12 de junho de 2013

Amor Eterno Amor


Seguindo a lógica do texto anterior, seria incoerente se eu deixasse passar o dia dos namorados sem escrever nada. Então a pauta do nosso caderno hoje é o amor.

Há algum tempo que me inquieto com a durabilidade desse sentimento, mais do que isso com a sua finitude. Não sou contra aqueles que declaram o seu amor em menos tempo do que dura o orgasmo de um galo. Não, definitivamente não. Sou um neo-hippie e para mim toda maneira de amor vale a pena.  Acho  que deveríamos espalhar indiscriminadamente pelas ruas esse tal de amor. Sim, de verdade acredito que devemos amar a pessoa da farmácia, do mercado, o trocador  do ônibus ou até mesmo aquela pessoa que passa do seu lado na rua. Mas é claro que existem várias formas de amor, e vou falar só daquelas entre homem e mulher. Ou mulher e mulher. Ou homem e homem. Ou homem e siglas (GLBTSWXKLM...) Enfim, vocês entenderam, né?

O que me intriga é o fim do amor. Nunca consegui compreender isso. Salvo as exceções em que a pessoa é traída, ofendida, enganada ou todas essas outras coisas feias que acontecem, não consigo compreender como pode que o amor acabe dentro de alguém. Para mim esse tal é um sentimento eterno, tipo sei lá  uma hepatite, que fica no nosso sangue pelo resto da vida. É óbvio que ele muda de aspecto, de manifestação e de fisionomia. Mas daí até acabar? Ah, essa não! Não me convenço do contrário.
É claro, temos muitas vezes que pensar que ele acaba. É mais cômodo e conveniente para enfrentar os rompimentos e encarar os futuros relacionamentos. Mais para mim isso não adianta, eu não funciono assim. Digo e repito: continuo amando todas as mulheres que passaram pela minha vida. Acho que seria um cretino se não sentisse isso. Como pode alguém dividir lençol, sorriso e lágrima com alguém e isso tudo depois virar nada? Que tipo de ser nós somos que não conseguimos sublimar nossos egos para manter esses amores vivos.

Talvez, seja aquele velho papo do grande amor da vida. Outra coisa pra mim das mais cretinas. Quase medieval. Parece que podemos ter apenas um grande amor, O grande amor, e é claro que para isso todos os outros que vieram antes se tornam insignificantes. Mas me recuso a acreditar que a gente possa ser tão bobo assim. O amor é um sentimento construído, e seria muito cruel que a gente possa ter só um na vida inteira né?

"Que seja eterno enquanto dure esse amor, que dure para sempre" Como diria Castro Alves, ou melhor, Negritude Junior. Os meus amores eu vou guardar para sempre comigo. Alguns podem chamar isso de carinho, de afeto, de saudade ou do que quiserem. Eu chamo de amor. Na lembrança do brinco de granada que era tão dela, dos quadros que pintamos para a casa nova, das descobertas espirituais do amor, das venturas sexuais da adolescência, e porque não daquele namoro de mão dada na escola. E outros tantos amores verdadeiros que vieram e que virão. Tenho todos eles ainda pulsantes.  Porque meu peito é grande e nele cabe toda a imensidão do mar.




segunda-feira, 10 de junho de 2013

O Porque dos porquês




















Acho que antes de tudo devo explicar minha inspiração inicial. Seria incoerente se eu não o fizesse.
Somos doutrinados a ser coerentes desde sempre. É uma cobrança social que vira mais parte de nós do que um rim, um fígado ou até um pulmão. O "ser coerente" me parece que é uma forma de provar aos outros que somos sérios, dignos de confiança e de respeito, e sinceramente, tenho buscado andar na contramão disso. Acredito que somos incoerentes e que não há mal nenhum nisso. Racionalizar o comportamento humano ao extremo até acharmos que somos capazes de seguir uma mesma lógica durante muito tempo é supervalorizar a nossa capacidade intelectual. Portanto me declaro já de início um incoerente por princípios. Não quero manter uma mesma opinião por muito tempo, e nem me esforçar para ser lógico e justificável a longo prazo. Como diria Raulzito, prefiro ser essa metamorfose ambulante...
No entanto, aqui dentro, continuam a trabalhar meu rim, meu pulmão e meu fígado. E o último, muito a contragosto...